terça-feira, 24 de maio de 2016

A Rotina que acabo de "contar"...

- A rotina lhe matará!
Gritou o homem ao microfone, e logo após mais alguns pensamentos, encerrou a palestra enfatizando alguns outros conselhos rápidos. Não achei a frase tão impactante como das outras vezes. Permaneci sentado tempo o suficiente para vê-lo descer do palco, olhar o relógio e trocar palavras com alguns ouvintes mais entusiasmados, que se aproximavam para... quem sabe tirar algumas dúvidas...
 Ironicamente era a terceira vez que ouvia esta mesma frase vindo dele. Não que ele não pudesse, só achei menos impactante. Mais uma vez percebi o seu "ritual" de conferir o relógio, ligar o celular e acenar longamente enquanto caminhava em direção a porta. Todas essas coisas soaram para mim como um “dejavu”.
Isso não faz as palavras dele menos certas, afinal são “constatações bastante pertinentes”, (ele usou tais palavras, gostei delas, decidi começar a usar.) A rotina vai mesmo acabar com a nossa vida; mas não é esse o real problema, até porque todo mundo precisa de uma rotina. 
O problema com a rotina, é que ela é definida pela sucessão de atos que fazemos... Bem, nem todos esses atos são ruins, afinal se você decide quebrar a rotina uma vez por semana (ou por mês), logo isso fará parte da rotina.
Consegue imaginar a cena de alguém cheio de tarefas e obrigações, consultando sua agenda para ter certeza do que fazer, já que sua mente já está superlotada e cansada, lá está marcado
 – Quinta Feira, 17:00, SAIR DA ROTINA, FAZER ALGO ESPONTANEO!!! 
(Me pareceu bem engraçado.)
A rotina, como eu dizia antes, não é real problema, e sim como lidamos com ela, pois se dermos a ela atenção, ela nem faz sentido. Quer ver? Quantas vezes eu já repeti “Rotina” até agora? Sabe quando você repete uma palavra tantas vezes que ela perde o sentido? Bem espero que tenha funcionado, (caso contrário, eu só cometi alguns erros feios de redação a toa).
Depois da palestra, todos foram dispensados, era tarde de sexta, alguns colegas decidiram matar o tempo extra comendo alguma coisa num lugar próximo. Rimos bastante lembrando de alguns “micos” que os novatos passaram durante a palestra.
Nunca vou entender algumas coisas:
1 – Como você não lembra do próprio toque de telefone?
2 – Como você não coloca seu telefone no silencioso quando o seu toque é uma música de uma banda de forró chamada “Calcinha Preta”?
3 – Porque essa banda? e nem me obrigue a falar daquela música...

De um modo geral foi um fim de tarde bastante divertido, quando cheguei em casa, ainda ri bastante relembrando a história enquanto contava para minha namorada, (Ela se sentiu um pouco mal pela pobre pessoa, mas ainda riu um pouco e logo me contou sobre o seu dia.)

É algo realmente bom fazer coisas desse tipo, ouso dizer que a palestra realmente serviu ao seu propósito. E apesar de agendada no calendário, foi uma quebra da rotina bastante espontânea, e saudável. 
Com sorte, talvez essa rotina não vá me matar... 

Nada (Melhor) - [ inspirado em Amianto - Supercombo]

Nada
Parece exatamente certo,
Nada é.
As coisas estão distantes,
(Como olhar através de binóculos)
As emoções deviam estar lá...
Me diga que há
Um sentimento certo
Que possa ser,
Finalmente usado
Pra curar.

Nada, exatamente nada,
Foi real, se não há
Verdade em si,
No coração de quem falou.
Tudo,
completamente diferente de como poderia ser.

Me diga então
Como mudar,
Ser melhor
Do que me fiz,
Até aqui.
Tentando ser, mais um
Amante.
Diga, apenas diga,
Que serei,

Melhor...

sábado, 21 de maio de 2016

Mau Agouro

- Olha amor, uma coruja, que bonita!
- Isso é sinal de mau agouro, cuidado... – o jovem foi irônico, repassando seu conhecimento adquirido com o tempo, isso era algo que todos repetiam. Sua namorada não recebeu tão bem o aviso.
- Mas “cuidado” porque? Acho que já ouvi algo sobre dar azar né? – a moça, aparentava real inocência para com o assunto.
- Sempre que aparece uma coruja assim é porque alguém vai morrer nessa área. – Ele quis dar realmente um tom mais assustador ao que dizia. Mas teve como resposta um sorriso e uma exclamação que logo encerrou a conversa:
– Mas sempre alguém morre, de alguma coisa, com ou sem corujas!
Ele a apertou um pouco mais com o braço que envolvia sua cintura, e com um sorriso de confirmação a beijou. Continuaram a caminhada apressando o passo para atravessar a rua.
- Idiotas! – o velho mendigo sentado falou alto, com certa raiva na voz. – Não ligue pra eles minha amiga! – ele olhou pra cima, falando para a coruja, que voava perto da casa da esquina, onde ele ocupava a calçada.
- E o qual o problema no que eles disseram? – a voz vinha da parte não iluminada da rua, e pertencia a um homem de passos lentos que dobrava a esquina e ia se aproximando. 
Um tanto surpreso o mendigo tratou de baixar a cabeça, e olhar apenas com o canto de olho para o homem que estava em pé ao seu lado.
A coruja então emitiu um som, que lembrava um grito desesperado, surpreendendo os dois, e logo voou para longe rapidamente.
- Elas não conseguem evitar. Não é culpa delas! Eu acho que essa nem sabia direito o que fazer. – o velho começou a levantar, bem devagar, ainda bastante desconfiado. Estava acostumado a ser considerado maluco, não esperava que qualquer um fosse ligar pro que dizia. Mas aquele homem, agora estendia a mão para ajuda-lo, aquilo era estranho. Era comum ser taxado como um louco qualquer, mas porque aquele homem estava ali fazendo perguntas, e porque dar atenção a ele?
- Você está falando das corujas não é? – o homem perguntou com um leve sorriso, instigando o velho senhor a contar mais.
- Quem é você? – por mais que o velho estivesse desconfiado, ele tinha vontade de começar uma conversa. Ele se apoiava nas grades de ferro do muro da casa, se encolhia, mas tinha vontade de continuar falando para um ouvinte, afinal o que teria demais em contar o que sabia? pensou por alguns instantes enquanto aguardava a resposta do homem.
- Sou só um curioso. Eu realmente achei interessante o que o senhor disse. Eu nunca achei esses pássaros algo ruim, mas muitas pessoas pensam o contrário, algumas tem medo, outras uma admiração. Mas o senhor está tendo compaixão... – Ele usou as palavras sabiamente, sempre com certo sorriso no rosto, mesmo que ele não fosse tão verdadeiro. Esperava que o velho realmente lhe contasse uma boa história.
- Porque não sentamos ali, naqueles bancos? – o homem convidou o velho, que já desistira de ir embora, e assumia uma postura ainda desconfiada, porém condescendente.
Os dois atravessaram a rua, e sentaram em um dos bancos da praça. A noite começava a esfriar. Mesmo ainda não passando das 19:00 o movimento era bem pouco naquele momento, apenas um pipoqueiro e seu carrinho ocupavam a pracinha junto a eles. O homem usava uma camisa social com a gravata bem frouxa e carregava no braço seu paletó, e tão logo se sentou tratou também de colocar sua mochila no chão ao seu lado. Nenhum deles eram tão velhos quanto aparentavam, os dois estavam desgastados pela própria vida, mas sob circunstancias evidentemente diferentes.
O velho se sentou e logo relaxou, observando o comportamento de seu novo companheiro que agora lhe parecia só mais um solitário como ele, alguém a procura de ouvir uma história para distrair a mente. Alguém disposto a dar ouvidos até mesmo a um mendigo, possivelmente maluco.
- Mas o senhor ia dizendo? – perguntou o homem de maneira simpática, mas olhando para cima, para o céu que se mostrava sem nuvem alguma e bastante estrelado.
- Todo mundo morre de alguma coisa, é claro e todo mundo sabe disso! – o velho falou como que retomando o assunto a partir da fala da moça. – Mas essas “alguma coisa” são importantes. Tem muitos tipos de morte. Você pode conhecer ela de várias formas, seja por algum acidente, doenças, de maneira natural, por uma injustiça ou até mesmo por justiça... Mas e quando ela vem da loucura? Da dor? E da tristeza?
O homem tratou de olhar o velho, que por sua vez, mirava a casa, do outro lado da rua, enquanto falava de forma compassada. Ele agora estava intrigado com a fala do senhor, com a sua postura sobre o assunto, tudo que era dito tinha sentido e até mesmo uma profundidade que ele não esperava de imediato. O velho havia se transformado, seu tom era outro, até mesmo sua postura tímida tinha sumido. A conversa caminhava para uma direção que ele não esperava de forma alguma. Limitou-se então apenas em confirmar com um aceno de cabeça.
- Eu não sei no que você acredita. – continuou o senhor após alguns segundos esperando que seu interlocutor assimilasse tudo o que era dito - Isso não importa muito agora. Mas você tem que concordar que a vida é importante. A morte é mesmo um fato. Mas não é sempre que ela é inevitável. Existem pessoas que se afundam muito em pensamentos, e em toda a sua própria loucura e tristeza. Ai chega um momento que ficamos sem opções, e por causa da dor, de continuar se debatendo enquanto afunda mais e mais, a morte se apresenta. Mas ela vem apenas porque foi convocada. No fundo ela sempre esteve ali, você sempre viu, ela apenas nunca tinha vindo conversar com você, mas com certeza já havia a conhecido. Não é como se não existissem outras coisas. Essa é questão, você está cansado e com dor, precisa de algo para se curar. Não está longe de ajuda. Qualquer coisa é bem-vinda, você está afundando porque não sabe mais em que direção ir. Se ao menos pudesse receber uma luz, ou ouvir alguma voz que pudesse seguir. Ser guiado para longe da escuridão.
O homem estava completamente envolvido pelas palavras do velho, que vez por outra respirava profundamente e olhava ao redor, enquanto continuava a falar.
- Agora imagine que você sabe de tudo isso,que você conhece essa situação por ter vivido ela, e vê alguém nesse mesmo estado. O que fazer?
- Oferecer ajuda?
- Qualquer um faria com certeza.
- Mas e a coruja? O que significa? O que o senhor está querendo dizer?
- Como eu disse não importa o que você acredita. Não estou pedindo pra acreditar no que eu vou dizer, mas, existe uma velha história, e não me pergunte de onde ela surgiu, eu só sei que ela é antiga, e já foi passada por muitas gerações. Bem, existiram algumas pobres almas que viveram toda a dor, desespero e loucura que já falamos, e em certo ponto da vida, estavam sem mais qualquer esperança e encontraram na morte uma possível solução para acabar com todo seu sofrimento. Mas quando tomaram então sua última escolha em vida, elas se arrependeram. Dizem que o tempo passa muito devagar quando se está morrendo. O que você faria se desse de frente com um erro sem conserto? Eles fizeram uma última prece, e suplicaram por uma segunda chance. Mas como eu disse, a morte havia sido convocada por eles, não havia mais como mudar isso. Mas aquilo era inédito e por conta disso uma exceção foi aberta. Ela então guiou cada um para um plano fora da existência, e lá foram reunidos e levados para um encontro, onde as forças primordiais da vida e da morte se mostraram, e uma espécie de tribunal foi montado. Outras forças que atuam no mundo foram chamadas, e pediram para que os suicidas explicassem o que havia acontecido. Eles receberam a chance de falar sobre todo o peso que carregavam no coração, e como estavam perdidos quando se viram diante daquela infeliz decisão. Todos tinham em comum em suas histórias o profundo arrependimento, e a suplica por uma chance de ser diferente. Foi explicado a eles que não existia como voltarem ao mundo dos vivos, pelo menos não em seus antigos corpos. E com isso uma condição foi criada. Eles seriam transformados em animais, e com isso poderiam permanecer vivos, e em troca teriam que salvar aqueles que acabassem como eles.
- Transformados então em corujas eles tem que salvar alguém para então se salvar...
- É uma forma de ver. O que dizem é que essas almas transformadas, passaram a viajar pelo mundo. Elas podem sentir e de alguma forma ver o que cada um carrega em sua alma, mesmo aquilo escondido na escuridão dentro de cada um. E quando encontram alguém que está prestes a fazer a escolha, elas vivenciam nelas mesmas o desespero do outro e revivem ainda seu pior momento, a fim de relembrar o pacto. Elas tentam desesperadamente avisar, gritar ao seu jeito, fazer algo para interromper a pobre pessoa. Essa passou a ser sua missão nesse mundo. É isso que as corujas fazem.
- Faz algum sentido. Como o senhor disse, as vezes só buscamos alguma espécie de sinal, algo que possa servir de farol para sair desse estado desesperador...
O homem estava um tanto impressionado pela história contada pelo senhor. Ele refletiu por alguns instantes naquela situação, e no quão relevante tudo aquilo era, e mais ainda para ele. Quem poderia imaginar que algo tão profundo e legal poderia sair daquele daquela situação totalmente incomum.
Ele interrompeu suas reflexões apenas quando ouviu uma sirene muito alta, vinda da ambulância que estacionava em frente à casa onde antes o velho estivera ocupando a calçada. Ficou surpreso quando viu paramédicos descendo e conversando com uma senhora em frente a porta. Eté então ele não tinha notado que havia movimento ali.
- Você tem algum dinheiro para comprar pipoca? – o velho mais uma vez chamava sua atenção.
- Como?
- Eu te contei o que você queria, em agradecimento você podia comprar pipocas.
- Sim claro. Mas eu não gosto muito, compro para o senhor.
Ele levantou e foi comprar, após alguns momentos, entregou ao senhor dois sacos de pipoca. O velho agradeceu e começou a comer. Ao observar as mãos do senhor com mais atenção ele notou que havia uma tatuagem de coruja no pulso dele. Um tanto apagada pelo tempo, mas um detalhe interessante, pensou consigo. Observou mais uma vez a casa, e viu que se aglomeravam algumas pessoas, curiosos, para saber o que havia acontecido. Logo viu uma maca com alguém sendo carregado para fora da casa, e logo atrás a senhora de novo trancando a porta e subindo na ambulância junto dos médicos. O som da sirene ecoou de novo, dessa vez se afastando. As pessoas continuavam em frente à casa. 
Ele decidiu que deveria ir embora para sua casa.
- Como é o seu nome? – perguntou ao velho que se ocupava apenas comendo.
- Todo mundo me chama de Coruja.
- Bem, pois eu agradeço por compartilhar seus pensamentos e a historia Coruja, já vou indo. Muito obrigado, e Boa noite!
Recolheu suas coisas, e com um sorriso ainda, começou a atravessar a rua de volta a esquina, tudo aquilo era mesmo muito curioso. Ao chegar próximo as pessoas, não se conteve e teve que perguntar o que havia acontecido.
- O cara tentou se matar. - teve sua resposta dada por um jovem que talvez não tivesse nem 20 anos.
Ele ainda ouviu os outros completarem as informações, dizendo que a mãe do rapaz que morava na casa sozinho, havia vindo procurar por ele, e o encontrou desacordado no quarto e cheio de sangue nos braços, mas ela ligou para o socorro e ele foi levado com vida para o hospital.
Bastante surpreso o homem desejou boa noite a todos e seguiu seu caminho, refletindo sobre todos os acontecimentos que tinham acontecido com ele durante aquele dia, em especial nos mais recentes. Ele ajeitou então a mochila nas costas e olhou para o céu mais uma vez. Sorriu prazerosamente e falou baixinho:


-Bom trabalho corujas, 2 em uma noite

terça-feira, 10 de maio de 2016

O dia que não lembro

Eu não lembro de quando eu morri. E isso é muito chato, de verdade mesmo. Eu tenho estado bem ruim de memória. Não consigo lembrar de datas e sou péssimo com nomes, mas não acho que morrer tem algo a ver com isso, afinal, muita gente é assim desde sempre. Sem contar que eu só estou morto há uma semana, não acho que isso vá influenciar na minha memória. Eu não sei porque insisto em pensar nisso, quer dizer... eu sei... foi por causa do cara que me assaltou. Engraçado que na hora me veio aquela sensação de “dejavu”, e ao mesmo tempo eu não estava mais ali, eu via tudo de fora, ai ele disse as palavras que retomaram minha atenção:
- bla bla blá, SE NÃO, VAI MORRER, aqui mesmo...
Que irônico, eu tinha quase certeza que não ia morrer mesmo, mas ele tinha uma faca, então dei o “celular do ladrão” pro cara, talvez ele precisasse mais do que eu; esse é um pensamento bem idiota, mas eu estou tentando mudar, também estou tentando desapegar, é aquela velha frase: “caixão não tem gaveta” ... Continuo meu caminho para casa e os pensamentos me inundam.
Não sei o que me incomodou mais, se a ameaça que pareceu vazia, ou a chance de ser um corpo jogado na rua, uma “vítima dos nossos tempos difíceis”, mais um número para preencher a estatística. Isso me faz refletir agora. Muitas pessoas morrem, e muitas morrem de maneira estúpida, por um idiota qualquer. Muitas vezes não tem nada daquela coisa dos “tons de cinza”, o cara não está “tentando sobreviver e aquele é seu último recurso”; não, nem sempre é isso, aquele cara parecia ser totalmente cinza, ele já não se importava com nada. Preferi ceder. Outras alternativas mal faziam sentido. Mas isso não importa. Estou em casa agora. Tirar os sapatos é minha maior preocupação.
Preciso me sentar; caramba... pensar demais sempre me deixa mal.
Eu não queria ficar depressivo, não hoje em especial, afinal estou “não morto” há uma semana, é um novo aniversário a se comemorar, é uma data de recomeços é um novo começo, afinal a vida está só... que droga, fiz de novo, agora vou ficar pensando na morte... Que droga, vou ficar pensando NA MINHA morte. Eu não sei se queria mesmo me lembrar disso...
(Uma semana atrás:)
Dia 1:
Minha casa está escura, sei que é madrugada, um pouco da luz de fora entra em casa. Me levanto do chão com dificuldade, meio que sinto um pouco de dormência no corpo. Meu braço esquerdo tem um corte, eu sinto quando coloco a mão. Estou de joelhos no chão, olho em volta, tento entender o que aconteceu. Me levanto, sento no sofá. Meu computador está ligado. Olho com atenção o que tem na tela: DOWNLOAD CONCLUÍDO - bem poderei assistir mais uma temporada da minha série agora, só preciso arranjar um tempo. Meu lado esquerdo inteiro parece dormente. Coloco a mão em meu peito. Mais abaixo, um corte superficial eu acho, não lembro de nenhuma cicatriz ali antes. Eu respiro fundo, começo a ficar muito nervoso, a luz do monitor ilumina o corte no meu braço, caramba, eu devo ter perdido muito sangue. Que droga não é só um corte... Não lembro do que aconteceu...
Por que eu estava no chão? Caramba eu desmaiei? Eu acho que não posso ver sangue!
Não consigo lembrar direito...
O corte está fechado, meio avermelhado. Não sinto dor, na verdade eu não sinto mesmo nenhuma dor, só um incomodo, será a luz? É um desconforto bem chato. Me levanto, onde está o interruptor? Pronto, “que se faça luz” ...
Mas quanta bagunça. Eu estava mexendo nos meus livros? E todos esses papeis no chão, e mais embalagens... e eu vou ter que limpar. Se bem que até ai é normal, eu apenas não consigo lembrar direito. Olho de novo para o meu braço, Caramba como eu pude fazer isso?
A porta está só encostada, isso é um grande erro! Mas a casa parece o.k. Preciso ir no banheiro. Papel com sangue no lixeiro, e um balde com minha camisa na pia. Um bom sinal, sou alguém organizado mesmo quando estou desmaiando. Tem sangue na pia. Então eu me limpei, troquei a camisa manchada, e só ai fui parar no chão. Legal. Vou deixar essa camisa de molho mesmo.
Preciso me sentar. Isso é muito perigoso, numa dessas eu morro... haha! Eu sorrio pra mim mesmo, estou nervoso comigo mesmo, olho de novo meu braço, preciso de alguma coisa pra cobrir isso.
Mas como “isso” aconteceu? Nenhuma mensagem no celular... isso é bom? Eu devia mandar algo pra alguém né? Será que tem alguém online? É madrugada, melhor deixar pra lá. Faz tempo que não respondo ninguém mesmo.
Não consigo dormir. Enfaixo meu braço com uma camisa qualquer, e vou assistir mais alguma coisa no computador, com sorte pego no sono.
O celular despertou, 06:30 am. Alarme desligado. O lado bom é que maratonei minha série, o ruim é que não prestei muita atenção nesse último episódio, e que legenda errada, dia desses, quando eu tiver tempo, vou me juntar a um desses grupos que fazem legenda pra consertar isso. Todos merecem uma legenda de qualidade... haha, que idiotice...
Me sinto estranho, evito pensar de mais, bem de qualquer forma, acho que já posso responder todo mundo, um bom dia seguido de “emoticons” de gatinhos, eles vão adorar, nem vão reclamar por estar respondendo só agora essas mensagens antigas...
- ATRASADO!
Caramba, como a pessoa ainda reclama, por eu ter respondido?! podia muito bem ter ficado sem falar nunca mais! E se eu não respondi por algum motivo importante? E se eu morresse? Será que alguém ligaria? Chega de pensamentos idiotas. Ainda é muito cedo. Que droga não quero tomar banho, eu não quero olhar essas cicatrizes. Mas elas não estão doendo ainda. Será que eu tomei alguma coisa? Ai meu Deus. E se eu tomei alguma coisa e agora eu ‘tô assim; quando o efeito passar vou ficar uma droga.
Preciso de música.
-Little Talks – Of Monsters and Men. - pronto, é um bom começo!
Termino de me arrumar, ouvindo o refrão. Música boa. Estou pronto pra mais um dia. Eu estou dizendo isso para mim mesmo...
Todo o bom humor do primeiro do começo do dia foi embora as 09:00 da manhã; eu fui ao trabalho. O resto do dia passou praticamente normal. Hospital, Trabalhar, comer, trabalhar, ir para casa. (Normal exceto pela parte do hospital talvez). Eu olho em volta enquanto
caminho para casa, é um entardecer frio. Todo mundo centrado em suas próprias “missões pessoais”, eu sinto que conheço aquela pessoa de algum lugar... eu não enxergo bem, preciso de óculos novos... Onde estão meus óculos? ... Ela não me reconhece, ou talvez não me viu direito. Normal.
Não olho mais o celular quando chego em casa. Preciso me sentar. Gasto apenas dois minutos mudando os canais na TV. Eu me deito, coloco músicas aleatórias. Acabo dormindo.
Dia 2
Acordo de madrugada. Um incomodo novamente. Melhor responder as pessoas no celular. Nossa, nunca vou conseguir acompanhar essas conversas nesses grupos. Não vale a pena. Deixo o celular em cima da cama. Me levanto. Acendo as luzes, mas não sei o que eu estou procurando...
Adoro meus livros. Tento me apegar a esses pensamentos bobos. Meu braço está ardendo. Não! O “corte” no meu braço está ardendo. Lembro da cara da moça no hospital quando ela deu os pontos no meu braço. Ela queria muito saber o que aconteceu de verdade. Mas eu também queria.
Ligo a TV”. Porque eu ainda faço isso?
Volto para a internet. Me entretenha, é quase como uma ordem dada a mim mesmo. 20 minutos, passam voando. 1 hora depois e eu estou aqui, ainda cansado, ainda sem vontade de dormir, ainda “incomodado”, mas posso dizer que me entretive, durante esse tempo.
Preciso fazer alguma coisa... Começo a pensar nas coisas que eu deveria fazer... a que droga, é uma sensação horrível, sinto uma leve falta de ar. Eu deveria ser tão diferente. Como acabei assim? Porque eu não faço nada? Droga. Meu coração bate rápido. Continuo me cobrando. E continuo sentindo esse desconforto. É quase como uma espécie de dor. Mas eu simplesmente não consigo fazer nada. Se continuar assim, vou começar a chorar. Que loucura... Eu não suporto isso!
Me levanto, volto a minha cama, puxo um lençol, mexo no travesseiro, arrasto outro lençol. Porque eu estou dobrando isso? Porque eu estou arrumando minha cama, as 05 horas da manhã?
Agora está tudo mais ou menos arrumado. Relativamente limpo. Bem vou tentar ler. É o que me resta fazer...
Fico feliz por colocar alguma leitura em dia.
Eu ouço o despertador do celular. Me levanto, vou até ele. Desligo. Minha rotina volta a acontecer. Eu quase consigo ignorar meu braço enfaixado. Eu me esforço para isso na verdade. Evito pensar sobre isso. Música, isso sempre ajuda.
- No One Knows – Queens of The Stone Age.
Agora sim, minha cabeça está longe. Eu continuo fazendo tudo quase que de modo automático. Apenas paro para trocar algumas faixas da lista de reprodução. E quando dou por mim, lá estou eu de volta ao meu trabalho. Estou decidido a fazer alguma coisa, a tentar algo. Eu tento cumprir minhas obrigações de forma exemplar. Já é alguma coisa. Chego a quase me sentir melhor. E então meu braço dói um pouco.
O pensamento é algo muito interessante, não existe isso de não pensar em nada. Porque nessa hora, você está pensando em muitas coisas, elas só talvez não façam mesmo muito sentido, pois você fica trocando de pensamentos, e uma coisa que se liga a outra, puxa outra, e de repente eu me vejo pensando em como eu acabei assim, dessa vez não é um pensamento filosófico, eu realmente tento forçar a mente para antes de acordar no chão da minha casa de madrugada. Eu vejo flashes de acontecimentos, cenas se passando rapidamente, mas não sei distinguir se são mesmo reais, muitas delas parecem só repetições. Balanço a cabeça, tentando fugir desse sentimento... Eu estou bem, tenho um trabalho que me ajuda a pagar as coisas das quais preciso; Meus amigos estão bem também, eu vi na internet eu acho, com certeza eu devo ter curtido algumas coisas que eles postaram e pareciam bem.
Saio finalmente desses pensamentos, é hora de ir embora. No transporte eu ouço músicas enquanto observo as pessoas. Um belo videoclipe acabei de elaborar. Quem sabe um dia faça ele de verdade. Eu fico ensaiando sorrisos, lembrando de coisas muito antigas enquanto reparo as ações das pessoas. Hoje está tudo calmo, as maiores confusões são minhas e internas, todos parecem bem, apenas cansados talvez, eu não sou o único em silencio
observando, e isso é bom, eles parecem estar longe, pensando no que vão fazer a seguir. Eu também não tenho mais planos.
Dia 3
E se eu estiver morto?
Eu cheguei a uma conclusão, há muito tempo atrás, de que a morte é a finitude de tudo que existe, ela é o nada, em sua essência, ela é o vazio. Os suicidas quando optam pela morte, buscam de certa forma uma escapatória, pois eles já não conseguem permanecer diante de todos os seus problemas, minha maior questão na época era se eles queriam esse “nada”, para mim o vazio era mais assustador ainda. Maior que o medo de qualquer problema, maior que as consequências que eles trazem, maior que as dúvidas do dia a dia, o vazio é maior e engole tudo, e nada mais existe. Não, o próprio nada em absoluto é o que existe. E isso me assustava.
Eu posso ser considerado uma pessoa errada por estar “julgando”, e simplificando a questão do suicídio. Esse tema é muito pesado. Mas eu não estou fazendo nada que todo mundo já não tenha feito. As pessoas simplificam as consequências dos problemas, levando em conta as perdas que podem acontecer ao enfrenta-los, ou os caminhos que devem ser tomados para contorna-los. É muito estranho, pois o que as pessoas não aceitam é a questão mais simples na verdade, eles não compreendem que alguns de nós, simplesmente não conseguem enfrentar, e as consequências virão Disso. Este é o fato. Não adianta apontar e motivar, ou mesmo mostrar quão bom vai ser para alguém quando ela superar alguma situação, pois o que vai levar ela “aos finalmentes”, é o “simples fato” de que ela não consegue fazer nada, ela possivelmente nem vê sentido em mais nada, e a depressão surge dessa incapacidade, a ansiedade, por outro lado, vem das soluções possíveis, e no fim ao juntar isso tudo numa pessoa só... você terá divagações sobre o “fim”.
São 05:30 am, estou acordado desde as quatro. Fico pensando que eu poderia já estar morto. A morte é o nada, o vazio, e eu estou a muito tempo me preenchendo de toda forma possível com tudo o que eu vejo. Eu tento consumir cada vez mais, mais livros, mais filmes, falar com mais pessoas, assumir mais trabalhos, criar novos objetivos... Eu estou desesperadamente tentando evitar o vazio, pois
ele me assunta mais que qualquer coisa. Mas eu continuo sentindo ele tão próximo.
Me levanto trancando todos esses pensamentos. É hora de “ficar de boa”, chega de todas as bobagens. Logo me apronto para sair e cada, estou horas adiantado, e o clima ainda está frio, perfeito para caminhar.
Não tenho pressa, sorrio para as pessoas por quem passo. É estranho pensar o quão próximo e ao mesmo tempo distante pode se estar de alguém. Estamos ali vivendo na mesma cidade, bairro ou rua, mas não a mesma vida. Isso nunca, de jeito nenhum.
Tenho tempo de parar na padaria, o cheiro de pão é muito sedutor. Impossível não te deixar feliz na hora. Sou interrompido do meu transe com uma voz familiar:
- Ei, há quanto tempo?
- Ei, muito mesmo...
Não consigo reconhecer na hora, mas ela não parece ter dúvidas de quem eu sou. Tento reagir o mais natural possível, nos abraçamos, e falamos amenidades. É tão bom reencontrar alguém dos velhos tempos. “Descubro” que estudamos juntos, e já não nos víamos há pelo menos 5 anos. Nossa, o tempo passa, e nem percebemos. Fico feliz de saber que ela está bem, se casou e tem filhos pequenos. Me parece uma ótima vida.

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Provocação

Estavam deitados de frente um para o outro, a mão dele repousava na cintura dela, ele ensaiava um sorriso, pensando no que falar, ela tinha os olhos meio fechados, com a cabeça mais encolhida em direção a seu peito; com sua mão ele sentiu quando ela iniciou o movimento para virar-se e levantar, ele rapidamente a envolveu mais fortemente, interrompendo a ação dela e mais uma vez mantendo-a em seu abraço:
- Não, ainda não! – ele disse, ainda baixinho e de olhos cerrados.
Ela forçou o movimento mais uma vez e sentou-se na cama, com um movimento levou os cabelos para trás da orelha, sua expressão era uma mistura de seriedade e sorrisos que surgiam em sua face toda vez que ele a tocava, ainda tentando traze-la de volta, para prolongar aquele momento; mas tão logo ela levantou-se de vez, ele percebeu que mais uma vez teria que insistir naquele assunto:
- Mas você está aqui comigo e na minha casa, conheceu todos que fazem parte da minha vida... – dessa vez ele estava sendo mais direto a ponto de não restarem duvidas da sua proposta.
- Eu não posso me relacionar assim de novo, ao menos não colocando títulos nas coisas – ela disse finalmente.
Ele sentava na cama enquanto ela se colocava de pé em sua frente, as mãos mais uma vez a seguravam pela cintura, dessa vez ela não resistiu ao encontro dos corpos; ele fingia morder sua barriga e fazia cocegas nela numa tentativa de diminuir a seriedade daquele momento. Por fim ela sentou em seu colo e beijou-o levemente, e disse que precisava ir embora. Ciente de mais uma derrota, ele decidiu manter as coisas como estavam, já era muito incomum ele ter que insistir em um relacionamento sério, era melhor não insistir em mais nenhuma proposta e apenas aproveitar dos momentos que passava com sua...
A falta de uma definição sobre a relação ainda o incomodava, mas estava decidido a apenas aproveitar os momentos juntos. Após mexer em seu celular e pegar algumas de suas coisas, ela dirigiu-se ao banho, uma ultima olhada na direção da moça fez com que ele confirmasse para si mesmo que toda a situação valia a pena, ela conseguia mantê-lo completamente atraído apenas com o caminhar e vestida com um baby-doll qualquer.
Ela fazia um rabo de cavalo em frente ao espelho, e observou lateralmente que ele a observava, existia um clima de provocação não declarado, ela se virou e sorriu, cruzando os braços falou:
- E Então?
- Então o que? – Respondeu com um leve sorriso enquanto sua mente trabalhava em mil pensamentos e possíveis ações.
- Não vai me dar a toalha? – Ela respondeu com naturalidade, ciente do que despertava nele.
- Quer só a toalha? – Foi sua vez de provocar, com a diferença que suas investidas eram bem mais diretas e provocativas.
- É só o que eu preciso pro banho né?  - Ela gostava daquele jogo.
A tensão sexual entre eles aumentava gradativamente, e quando percebeu que ele se levantava ela preferiu encerrar a brincadeira:
- Aqui já tem uma né?!, pode ir indo tomar café então, daqui a pouco eu saio!
Ele deixou que ela encerrasse sem dizer mais nada, ainda era muito cedo para qualquer coisa, eles já haviam passado a noite juntos, agora ele também iria com mais calma; Ao menos por essa manhã.